Introdução
Neste fim do século [a autora referia-se ao séc. XX] a perda
de valores e referências é geral. E segue aumentando o número de pessoas
que não se encontram mais em si mesmas. A sensação de desordem permeia
as relações, o trabalho, a arte, a vida. Na busca de realização, fórmulas
milagrosas prometem satisfação rápida e fácil. Mas, essas curas do
tipo fast-food instantâneas e efêmeras agem apenas
na superfície: tirando-se a camada externa, o que sobra é o caos.
A verdadeira harmonia nasce de dentro para fora. Calma e gradualmente.
Para alcançá-la, além de esforço pessoal, são necessários instrumentos
adequados, já que pouco serve a força e a vontade de um lenhador se,
em vez de um bom machado, lhe for oferecida uma simples faca. E é
aí que as artes entram em cena.
O impulso artístico proposto por Rudolf Steiner e formulado pela Antroposofia
por meio da euritmia, escultura, pintura e arte da fala é o
machado afiado que possibilita ao aprendiz entrar em contato com seus
próprios veios. Na busca do elemento artístico específico de cada
arte, a pessoa depara-se com o universo dos fenômenos, conhece suas
formas de expressão, e pode criar a partir de elementos como equilíbrio,
movimento, cor, som, forma, ritmo, etc. A aproximação com tais elementos
exige concentração e auto-observação, qualidades que se adquirem durante
o próprio fazer artístico.
Ao criar algo completamente novo, saído inteiramente do seu interior,
a pessoa trabalha e mostra seus limites ao mesmo tempo em que afirma
sua individualidade e valoriza a si mesma. E é assim que, com a ajuda
da arte, dá os primeiros passos rumo à superação de si mesma.
O fazer artístico ampliado pela antroposofia é sempre um veículo
de expressão da alma. Assim, ele pode ser realizado com duas intenções:
uma artística, onde o objetivo é a comunicação plena do artista
que segue por um caminho de auto-transformação com o espectador
da obra de arte, podendo atuar positivamente sobre este. E outra,
terapêutica, onde o fim a ser alcançado é o equilíbrio e a harmonização
interna do indivíduo.
Em cada arte, um elemento, uma função
Escultura
O corpo-a-corpo do aprendiz com a matéria barro, madeira ou
pedra e a metamorfose da mesma, ensinam e despertam o respeito
pelo material e o conhecimento das forças vitais do universo (expansão,
contração, volume, espaço, movimento, ritmo e equilíbrio). Aprende-se
a criar respeitando as qualidades de cada material, visando captar
sua essência e não apenas a sua aparência.
Pintura
A investigação das cores e de suas características é o ponto de partida
para o trabalho do pintor. Ao conhecer as qualidades de cada cor (expansão/contração,
movimento/calma...) o indivíduo confronta-se com suas próprias qualidades
e dificuldades. Com esse conhecimento ele pode utilizar a essência
das cores para revelar muito de si próprio. Veja as páginas
com quadros de Gisela Nisch,
Inês Benou, Myrian
César e Rosa
Prado.
Euritmia
Diferentemente das artes plásticas, a euritmia não lida com materiais,
mas com um instrumento: o próprio ser humano que, de forma sutil,
reproduz com gestos os movimentos realizados pelo aparelho fonador
ao cantar e falar. Juntamente com a música e a poesia, o euritmista
expressa suas vivências mais íntimas. Segundo Rudolf Steiner, a euritmia
é a fala visível. (Ver a seção
de euritmia.)
Arte da Fala
Na fala a pessoa revela-se, traz à tona conteúdos que nem sempre
deseja tornar públicos. O estudo e a sensibilização do falar mostra
vícios de entonação, expressão, tensões, dificuldades respiratórias
etc. Depois de se perceber, o indivíduo pode falar de forma consciente,
desenvolvendo as qualidades artísticas da linguagem e expressando-se
artisticamente.
Terapia Artística
(Texto contribuído pela AURORA - Associação Brasileira
dos Terapeutas Artísticos Antroposóficos.)
A terapia artística fundamenta-se na visão médica,
terapêutica e artística ampliada pela Antroposofia de
Rudolf Steiner, segundo a qual o homem é um ser constituído
de espírito, alma e corpo vivo, e no conhecimento teórico
e prático dos elementos das artes e das leis que os regem.
Assim, por meio desses elementos, que nas artes plásticas são,
por exemplo, cor, forma, volume, disposição espacial,
etc., a terapia artística possibilita que a pessoa vivencie
os arquétipos da criação, ou seja, se re-conecte
com as leis que são inerentes à sua natureza interior
mas que foram "esquecidas" por diferentes motivos. Com isso,
traz um contato com a essência sanadora de cada um. (Ver a subseção
de terapia artística
dentro da seção de medicina
e terapias antroposóficas.)
Ampliação de fronteiras
O impulso artístico baseado na antroposofia rompe barreiras e chega
muito além das galerias, dos palcos e das clínicas de terapia. Crianças
carentes, portadores do vírus HIV, excepcionais, estudantes de psicologia
e pedagogia, empresários e pacientes de hospitais que conhecem e trabalham
com estes princípios, são alguns exemplos da expansão dos domínios
da arte.
O mundo está carente de arte. Vivemos um momento muito intelectualizado,
onde as pessoas têm medo da arte. Com meu trabalho espero contribuir
para que os alunos soltem-se e encontrem-se consigo mesmos por meio
das cores, sintetiza Márcia Correia Lourenço, artista formada
pelo Centrarte, e professora de pintura nos cursos de Pedagogia e
Psicologia da Universidade de Ribeirão Preto e no PRAIDS (casa de
apoio a aidéticos).
É a arte ampliando seus limites. Ao ultrapassar o conceito da arte
pela arte, ela cresce e passa a exercer uma grande função social.
Tanto sobre seus praticantes, como também sobre todos aqueles que
têm a oportunidade de, simplesmente, apreciá-la.
Livro
Steiner,
R. História da Arte Reflexos e Impulsos Espirituais
(Kunstgeschichte as Abbild innerer geistiger Impulse). GA
292. 13 palestras proferidas em Dornach, Suíça, de
10 a 25/10/1914. Tradução da versão em francês
de M.M. de Morais e J. Hosomi. São Paulo:
Editora Antroposófica,
2010. Acompanha CD com reproduções de cerca de 800
obras projetadas por Steiner durante as palestras, mencionadas e
numeradas no livro (há um diretório geral inicial
com todas as fotos com esses números, seguidos do número
da palestra em algarismos romanos, e depois elas são repetidas
em um diretório para cada palestra).
Vídeo
Veja um interessante vídeo (em alemão, com legendas
em inglês) na página sobre a exposição
Rudolf Steiner und die Kust der Gegenwart (Rudolf Steiner e
a arte do presente), do Kunstmuseum (Museu de Arte) de Wolfsburg,
Alemanha, descrevendo a exposição de 13/5 a 3/10/10
desse museu.