Como a Antroposofia foi introduzida por Rudolf Steiner, ela está
intimamente associada à sua vida (veja uma
biografia cronológica; seu
retrato neste site e um
site com retratos de várias épocas de sua vida). Ele nasceu
em Kraljevec, na fronteira austro-húngara, em 1861 e faleceu em Dornach,
Suíça, em 1925. Formou-se na Escola Politécnica de Viena, e doutorou-se
em Filosofia na Universidade de Rostock, na Alemanha. Logo depois
de sua formatura na faculdade de engenharia, foi convidado para integrar
a equipe que estava produzindo uma edição completa das obras de Goethe,
em Weimar. Ele ficou encarregado de editar as obras científicas, o
que originou seu livro traduzido com o título A Obra Científica
de Goethe, (São Paulo:
Editora Antroposófica, 1984). Sua tese de doutorado, publicada
com o nome de Verdade e Ciência, trata da essência da atividade
do pensar, tendo sido posteriormente estendida na obra de cunho filosófico
que ele considerava tanto a mais fundamental como a que perduraria
por mais tempo, A Filosofia da Liberdade (Ed. Antroposófica,
1968).
Depois do período de Weimar, ele passou um tempo em Berlim, onde
atuou como redator de uma revista de literatura, e onde deu aulas
de História e Filosofia em uma faculdade aberta para operários, até
entrar em choque com a concepção marxista dos diretores. Em Berlim,
freqüentando círculos literários, entrou em contato com o movimento
teosófico. Em sua biografia, ele relata que foi o único grupo que
estava interessado em ouvir o que ele tinha a contar de suas pesquisas
do mundo espiritual, que fazia há muito tempo. Isso levou-o a, no
começo do século, iniciar uma extensa carreira de conferencista, expondo
suas idéias esotéricas. Atuando na Sociedade Teosófica, acabou por
tornar-se seu Secretário-Geral na Alemanha. Ainda antes do fim da
primeira década começou a entrar em choque com os dirigentes dessa
Sociedade, que haviam abraçado uma corrente fortemente orientalista,
e declarado que um jovem hindu, Krishnamurti, era uma reencarnação
do Cristo. Steiner opos-se totalmente a essa idéia (mais tarde negada
pelo próprio Krishnamurti), o que o levou a proferir alguns de seus
ciclos de conferências mais importantes, sobre os Evangelhos (quase
todos publicados no Brasil pela Editora Antroposófica). O choque daí
resultante levou em 1913 à sua separação da Sociedade Teosófica; vários
membros da mesma seguiram-no, tendo sido fundada uma primeira Sociedade
Antroposófica (a palavra Antroposofia já havia sido empregada
antes por alguns filósofos e por ele próprio, por exemplo como título
de palestra proferida por ele no mesmo dia em que assumiu a secretaria
geral da Sociedade Teosófica Alemã). Daí em diante, o movimento antroposófico
cresceu, tendo culminado com a construção de sua sede em Dornach,
na Suíça, em um prédio de madeira que ele denominou de Goetheanum
(veja
uma foto dele), construído durante a 1a. guerra mundial, e que
era uma verdadeira obra de arte. Aliás, foi Steiner que introduziu
nos congressos do movimento Teosófico atividades e apresentações artísticas,
que passaram a constituir parte essencial de todo o movimento antroposófico.
Não há curso longo ou congresso de Antroposofia que não envolva atividades
artísticas -- que constituem uma das bases fundamentais da Pedagogia
Waldorf.
Em 1919 Steiner foi solicitado por Emil Molt, diretor da fábrica
de cigarros Waldorf-Astoria em Stuttgart, Alemanha, a pedido de seus
funcionários, a organizar uma escola baseada em sua cosmovisão do
ser humano. A escola inicial logo independizou-se da fábrica e cresceu
rapidamente, existindo ainda em Stuttgart, e foi o germe do movimento
mundial da Pedagogia Waldorf (para uma excelente introdução a ela,
veja-se Lanz, R. A Pedagogia Waldorf - Caminho para um Ensino mais
Humano, 6a. edição, Ed. Antroposófica, 1998). Veja também
lista das escolas e seminários de formação de professores Waldorf
na América Latina, com vínculos para outros "sites" com listas de
outros países e uma lista mundial.
Ainda em 1919 Steiner, reconhecendo que a 1a. guerra tinha sido fruto
de concepções sociais absolutamente incoerentes com a constituição
do homem moderno, escreveu o livro Os Pontos Centrais da Questão
Social e deu dezenas de palestras sobre uma nova organização social,
que ele denominou "A Trimembração do Organismo Social", aplicada hoje
em dia em organização de empresas e como base para o que veio a se
chamar de Pedagogia
Social e em movimentos da renovação econômica denominada
de
Economia Associativa. A Sociedade Antroposófica e as
Escolas Waldorf foram fechadas pelos nazistas, que queimaram os livros
de Steiner (a propósito, ele sofreu deles um atentado no início
do nazismo em München - Munique - o que resultou na transferência
da sede do movimento antroposófico para a Suíça). A Antroposofia e
suas iniciativas práticas eram também proibidas na União Soviética,
que confiscava os livros de Steiner em sua fronteira até a abertura
de 1989; desde lá têm surgido inúmeras escolas Waldorf em países do
leste Europeu.
Em 1921 a Dra. Ita Wegman fundou a
primeira clínica antroposófica, em Arlesheim, ao lado de Dornach,
e que subsiste até hoje com seu nome. Na clínica, Steiner e Wegman
já recomendaram o uso de atividades artísticas como terapia, o que
foi o germe da
terapia artística antroposófica. Ela foi desenvolvida mais tarde
pelos seus continuadores, sendo aplicada sob forma de pintura, modelagem,
arte da fala, musicoterapia, euritmia curativa, massagem rítmica,
etc. O movimento médico-terapêutico antroposófico é, depois da Pedagogia
Waldorf, talvez o que teve mais sucessso. Em particular, no Brasil
a medicina
antroposófica teve um desenvolvimento enorme.
Em paralelo com a Medicina, houve o desenvolvimento de uma farmacêutica
antroposófica, produzida principalmente por dois laboratórios, a Weleda
e a Wala. Eles seguem inúmeras indicações de medicamentos dados por
Rudolf Steiner, bem como resultados de pesquisas recentes. No Brasil,
há um grande
Laboratório Weleda, atendendo à demanda criada pelos inúmeros
médicos antroposóficos. Aqui foi desenvolvido por Flávio e
Marilda Milanese um novo método de produção de
medicamentos antroposóficos, dando origem ao laboratório
Sirimim.
Em 1912 Steiner, juntamente com sua futura esposa Marie Steiner,
introduziu nos congressos da Sociedade Teosófica duas novas formas
artísticas, a Arte da Fala e a Euritmia.
Esta, uma expressão corporal que tenta mostrar em gestos a essência
profunda dos sons falados ou musicais, é usada de 3 formas: artística
(espetáculos), terapêutica e educacional. Toda escola Waldorf deveria
ter aulas de Euritmia, devido ao profundo efeito educacional e formador
que ela tem, desenvolvendo sensibilidades e capacidades espacial,
motora, rítmica, auditiva e social.
Em 1924 Steiner foi convidado por um grupo de agricultores a proferir
um ciclo de palestras sobre agricultura, o que redundou no movimento
da Agricultura
Biodinâmica. Ela é um aperfeiçoamento da agricultura orgânica
levando em conta os ritmos cósmicos, e a interação entre plantas,
animais e o ser humano.
O primeiro Gotheanum foi queimado criminosamente na passagem do ano
de 1922-23. Steiner imediatamente passou a desenvolver os planos e
construir uma maquete para o 2o. Goetheanum (veja
suas fotos), em concreto aparente, o que estabeleceu as bases
para a arquitetura
antroposófica. Nela, as edificações são tratadas como obras de
arte funcionais, procurando integrar-se nas características do meio-ambiente.
As construções que usam a arquitetura antroposófica são logo reconhecidas
pela quase ausência de ângulos retos, a menos no contato com o solo.
De fato, um ângulo reto não deixa margem para quase nenhuma criatividade;
se ele é evitado, o arquiteto tem que decidir sobre qual ângulo usar
entre a infinidade de todos os outros, e que melhor corresponde à
estética e à funcionalidade.
Dentre as demais aplicações da Antroposofia, não se deve deixar de
mencionar a Pedagogia
Curativa, cujo início se deu com um ciclo de palestras de Steiner
em 1924. Dentro desse movimento o Dr. Karl König criou na Escócia
o que iria tornar-se o impulso mundial denominado Movimento Camphill
(ver, por exemplo, sua
entrada na Wikipedia), onde se formam aldeias com famílias
normais que abrigam em seu seio um certo número de deficientes,
estimulando-se a sua auto-suficiência.
Todas essas aplicações devem sempre basear-se na atuação de pessoas
que abraçaram a visão antroposófica do ser humano e do mundo. Não
há muito sentido em se aplicar certas técnicas terapêuticas ou pedagógicas
sem que sejam permanentemente inspiradas pela cosmovisão introduzida
por Steiner e aperfeiçoada pelos seus continuadores. Qualquer dessas
aplicações, quando desligada da fonte original, tende a se desviar
e se descaracterizar. Não é possível separar da Antroposofia alguma
técnica nela inspirada; se alguém trabalha com uma certa técnica derivada
dos ensinamentos de Steiner, e não concorda com sua cosmovisão, a
rigor não deveria estar de acordo com essa técnica. Isso se deve à
abrangência e consistência da Antroposofia, que acabam por formar
um todo coeso e dificilmente partido em compartimentos estanques,
seja de idéias, seja de técnicas práticas, ou de mesclas de ambas.
O contínuo estudo da formidável obra de Steiner é uma condição essencial
para que uma iniciativa prática social ou indifvidual baseada na Antroposofia
dê os frutos positivos e a renovação do indivíduo
e da sociedade que dela se espera. Ele mesmo disse que a Antroposofia
deveria mudar com o tempo. Seus continuadores têm introduzido várias
renovações, mas sua obra continua ainda a ser inigualável, pois ainda
não surgiu depois dele ninguém com a profundidade de sua visão e conhecimento.
Original: 15/3/98; última revisão: 17/6/09